sábado, 17 de agosto de 2013

CHUVA NA NOITE DE SÃO JOÃO

- Rui tem razão...  Vamos. Os muros são grandes mas enfeitamos, é São João. A casa está cheia. Chegaram a passar e disseram que não vão conseguir nada.
- Vejam bem, carregar lenha é pesado!
- Calma. Não se assuste, para tudo tem jeito, Ivan. Ao invés de botar dificuldades, ajude aqui... 
- Espero que você tenha razão. Além do mais, Marina não tem muito o que fazer na floresta. Já estamos com 
muito medo, está escurecendo...
- Pelo o menos a lenha já está junta - observou Ivan.
A opinião de Marina era para que não houvesse preocupações.
- A caminhonete tá ali, vai nos facilitar muito. Já pensou levar 
isto numa carroça?
- Vai ser lenha para queimar em duas ou mais fogueiras, aí vou
rezar para São João nos ajudar.
- Ajudar no que?
- Ora, nas nossas tarefa escolares, para passar no vestibular.
- Logo vi que tinha um interesse aí - disse Marina.
- Ivan, os estudos me alucinam. Sou meio preguiçoso e uma ajudinha 
de cima não faz mal.
- Que sombra de árvore gostosa. Vamos deitar para descansar um pouco
aqui - Ivan sugeriu.
- Tá louco, está ficando tarde! E ainda temos que fazer as fogueiras.
- Vamos aproveitar e comer alguma coisinha?
- Não, Ivan.
- Estou morrendo de fome! E de cansaço! 
- Tenho duas bananas, vamos dividir...
- Nunca comi uma banana tão gostosa, nem Adão no paraíso provou
Igual - disse Ivan.
- No Paraíso não foi banana, foi maçã, inteligente - respondeu Rui, rindo.
- Vamos parar com conversa e vamos levar a lenha para a caminhonete - afirmou Marina.
- Pois não, Marina. Você manda - disse Ivan.
- Marina, é a sua vez de pôr a lenha em cima - chamou Rui.
- Minha não, eu sou mulher e onde tem homem, mulher não carrega peso!
- E os direitos não são iguais? - retrucou Rui.
Os garotos começaram a botar a lenha em cima da caminhonete e logo terminaram. Seguiram caminho com Marina dirigindo, por ser a mais velha.
- Ou vida mais ou menos boa. Pegar lenha para São João me ajudar a passar no final de ano.
- Não sei, não. Acho que é melhor estudar mais. Sem esforço o santo não ajuda muito, não - respondeu Marina.
- Um esforço desse...   Já pensou se ele não me ajudar?
- A lenha é para o nosso beneficio. Comer milho assado, dançar forró ao redor da fogueira...
- E se eu passar a noite rezando?
- A melhor coisa, Ivan, é estudar. Respondeu Rui.
- Hoje a noite é de festa. Esquece isso, Ivan.
- Marina, eu sou preocupado dezesseis hora por dia.
- Dezesseis hora por dia? Por que?
- Por que os dias estão tendo dezesseis, e não vinte e quatro horas.
Você já percebeu?
- Realmente devemos rever isso. Os dias estão passando muito rápido
- E se chover hoje???  Já pensaram para onde vai a fogueira? - disse Rui.
- Vire essa boca para lá!- gritou Marina.
- Pode acontecer, todo dia chove nesse lugar.
- Tão engraçadinho! Aqui é Sertão. Sertão secão.
- Estamos chegando. Vamos descendo e sem parar. Vamos logo fazendo
as fogueiras.
- Marina, mas um rango fazia bem agora. Depois a gente faz as fogueiras.
- Não, vamos fazer logo! Depois a gente come tudo o que tem direito.
Os três fizeram as fogueiras e rápido, reclamando da barriga roncando da fome. Marina, muito astuciosa disse:
- Ivan, seu sacrifício começou agora. Você não quer que São João lhe ajude? Então, faça sua parte.
- Você me disse que tenho que estudar. Não adianta pedir ao santo!
- Mas quem sabe ele veja seu esforço.
Nisso o tempo mudou, se preparando para uma chuva. Eles terminaram de armar a fogueira, entraram e foram comer. O Rui, meio apreensivo, ficou olhando para fora e vendo que a chuva estava chegando.
- Ele disse, brincando, que ia chover e, pelo que estou vendo, vai mesmo.
- Muito bom...  Se chover - aprovou Marina - aposto que não cai dois pingos e pára.
- Sei não. Não aposto muito, não. O céu tá ficando escuro!
- Falta muito para a noite. Daqui para lá, pára.
- Você, Rui, profetizou que ia chover.
- Quem sou eu para profetizar nada. Disse brincando, se acontecer não tenho culpa.
A chuva começou forte. A lenha já estava ficando toda molhada. Os pingos foram ficando finos e nada de acender a fogueira. Marina se irritou, Ivan, também. Mas Rui resolveu acalmar os dois dizendo-lhes:
- Aqui nunca chove e só porque hoje é São João, vocês acham que não era para chover. Não deviam reclamar, deveriam estar satisfeitos. Está chovendo, coisa que é rara no nosso sertão. Se não podemos ter a fogueira, temos a chuva!
- É verdade, nunca podemos ter tudo ao mesmo tempo. São nessas pequenas coisas que aprendemos
que nem tudo está em nossa vontade- disse Ivan.
- Se a vontade é comer milho assado, comemos amanhã, se tiver estiado. Se não tiver...
- Fica para outro dia, Marina. O importante é a chuva - disse Rui - E viva ao São João!
  






2 comentários:

  1. Nas pequena coisinhas que aprendemos a lição

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  2. Adriana Versus Versus,
    Que gracinha de crônicas amiga..
    Alegre, contagiante.. Me senti com eles catando a lenha para a fogueira de São João... Parabéns querida pelo belíssimo texto, inclusive o final, mostrando com sabedoria que devemos agradecer sempre o que ganhamos... A chuva era mais importante..

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